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sábado, 26 de julho de 2014

A herança de Yvonne Pereira

Por Dora Incontri
Correio Fraterno
Ed. 447 set/out/2012




Após a desencarnação de Yvonne do Amaral Pereira, em 1984, o Correio Fraterno publicou um Suplemento Literário especial. Retratando sua vida e obra, um artigo da jornalista e escritora Dora Incontri prestava homenagem à medium, destacando sua discrição e incontestável contribuição na literatura espírita.




"Dia 9 de março último, exatamente cinco anos após a morte de J. Herculano Pires, desencarnou no Rio uma grande médium brasileira Yvonne A. Pereira. Numa casa do Meyer, onde morava com a irmã, partiu Yvonne, discreta e sem alarde. Como discreta e sem alarde foi sua laboriosíssima existência, inteiramente dedicada à causa espírita. Tivemos o privilégio de visitá-la pessoalmente mais de uma vez, até quando sua saúde lhe permitiu escrever. Depois falávamos por telefone em ligações interurbanas.
Criatura carinhosa e simples, jamais procurou a sua autopromoção. Cumpriu com humildade sua missão mediúnica e deixou uma valiosa contribuição para a literatura espírita. Na verdade, os livros de Yvonne A. Pereira apresenta um altíssimo nível, tanto do ponto de vista literário quanto do doutrinário. Nível, aliás, raramente alcançado pela maior parte da nossa vastíssima literatura mediúnica.
Yvonne, muito bem assistida pelos Espíritos Charles (seu guia), Bezerra de Menezes, Léon Tolstoi, Léon Denis, Camilo Castelo Branco e outros, publicou 12 obras que, sem sombra de dúvida podemos colocá-las todas no rol dos clássicos do Espiritismo. Acontece que a característica principal de Yvonne sempre foi a prudência. Pacientemente, ela aguardava que seus livros amadurecessem, às vezes durante décadas, dentro das gavetas. São verdadeiros artesenatos mediúnicos. Os Espíritos trabalhavam com ela e não somente através dela. As cuidadas notas de rodapé da própria Yvonne demonstram isso. Nesse sentido também merece especial destaque os interessantes Recordações de mediunidade e Devassando o invisível, nos quais a médium relata de próprio punho as suas experiências bastante instrutivas, tendo, entretanto, sido orientada por Bezerra e por Charles na escolha e na condução dos temas.
Exemplo ilustrativo do senso crítico de Yvonne é a introdução de Memórias de um Suicida, onde ela conta que esse livro lhe foi ditado por Camilo Cândido Botelho (pseudônimo que a própria médium deu a Camilo Castelo Branco, em respeito às dolorosas confissões feita por esse Espírito na citada obra). Entretanto, os relatos eram vagos e sem muito cunho doutrinário. Foram, assim, arquivados por Yvonne, que ficou à espera por mais de oito anos, quando então o livro recebeu o acabamento de Léon Denis. Essa foi a versão que veio a público e que representa um marco na literatura mediúnica, pois jamais as condições do suicida foram escritas com tanta cor e minúcia.
Composição idêntica têm os livros O cavaleiro de Numiers e Drama da Bretanha, originalmente esboçados por Roberto de Canalejas e concluídos por Charles, 40 anos depois.
Outro aspecto importante da herança mediúnica de Yvonne são os contos - gênero literário menos encontrável no meio espírita que o romance, por exemplo. E o principal autor dos seus contos mediúnicos não é nem mais nem menos que o inigualável Tolstoi. Ressurreição e vida retoma plenamente o acento ebangélico que o mestre russo adotava, sobretudo nos últimos tempos de sua vida terrena quando passou a canalizar sua verve literária para os ideais cristãos. E note-se que antes de recebê-lo, Yvonne não tivera praticamente nenhum contato com a obra tolstoiana. Em Sublimação, aparecem outros contos do mesmo autor espiritual.
Interessante observar também uma peça de outro gênero literário, ainda mais raro que o conto, na obra de Yvonne: a novela. E quem a ditou foi o maior autor do gênero em língua portuguesa, Camilo Castelo Branco. Intitulada O tesouro do castelo, a novela mediúnica faz parte da pitoresca obra Nas telas do infinito e narra um emocionante caso de castelo assombrado.
Bezerra de Menezes, o ilustre médico do Além, fou quem trabalhou muitíssimo com Yvonne. Durante vários anos, ditou receitas homeopáticas por seu intermédio. Cartas e pedidos chegavam de todo o Brasil e a abnegada médium psicografava receituário e orientação espiritual. Como legado de Dr. Bezerra pela mediunidade de Yvonne ficou-nos dois excelentes livros: Tragédia Santa Maria, uma trama de amor através dos tempos e Dramas da obsessão, dois casos extremamente ilustrativos que decerram todas as nuances do problemass obsessivo.

A Yvonne de outras eras

É bastante comum médiuns de maior sensibilidade saberem intuitiva ou claramente do seu passado espiritual. Para Yvonne, quando criança, a lembrança viva de sua existênciaanterior sobrepunha-se à realidade da atual, causando-lhe sérios desajustes. Depois, ao passar a adolescência como desenvolvimento de sua mediunidade e a dedicação ao estudo espírita, essa invasão do presente foi contida e ela pôde assumir mais tranquilamente os compromisso da sua vida atual. Mais tarde, porém, psicografou as histórias de várias de suas encarnações. A trilogia de romances, Nas voragens do pecado, O cavaleiro de Numiers e O drama da Bretanha são passagens sucessivas da personalidade de Yvonne como Ruth de La Chapelle, Berthe de Sourmeville e Andre de Guzman d`Albert, respectivamente.
(Texto de acervo da edição 160, de abril de 1984)

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